Foi num dos meus almoços curtos e rápidos com o Jonas que lhe mostrei a minha poesia. Ele leu-a, beberricando o seu sumo de laranja bem fresco, como ele gosta. Leu, de testa franzida, pousou o copo e mordiscou uma das azeitonas que vinham encavalitadas na sandes americana. Olhando o prato, perguntou:
- Joana, foste tu que escreveste isto?
- Fui...
- Está mesmo bom...
Sorri-lhe de uma maneira infantil e meia corada enquanto ele, ainda de olhos baixos, pedia:
- Mostra-me sempre os teus poemas, sim?
- Claro!
Então, deixando uma nota de 5 euros em cima da mesa do café, beijou-me na testa e despediu-se de mim, dizendo que falávamos mais tarde.
Só depois, quando o Jonas já ia longe, reparei que ele levara consigo o meu poema. Na verdade, era esse o meu desejo, que ele o guardasse com ele, bem perto do coração. Sei que foi isso que ele fez.
O Retrato
A mulher do retrato,
amante das paredes solitárias,
actriz a tempo inteiro
num sorriso falso,
encantador.
Pendente de ouro
sobre a pele de marfim,
reflectido nos olhos de prata
secos de lágrimas.
Mãos entrelaçadas no regaço,
dedos esguios,
garras geladas
envolvendo segredos
e pérolas de colares partidos.
Mulher sem alma,
eternamente bela e presente
de olhos fixos em quem passa
se alguém passa...
Juventude em tinta,
em traços finos de um pincel.
E mesmo trancada numa tela,
sente-se o seu perfume...
Até ao próximo post,
Joana F.