BLOG FECHADO

14
Out 09

            Debrucei-me no parapeito da janela, estava gelado e a pedra húmida. Passei a mão pela sua superfície rugosa e esfreguei as palmas lentamente uma na outra. Faltava pouco para nascer o sol. Uma linha de claridade prateada desenhava-se sobre os eucaliptos ao fundo da estrada. Pequenas gotas redondas deslizaram pela superfície do vidro, desenhando cordões de bagos líquidos luzidios. Girei o manípulo e abri a janela. Na negrura do espartilho bruxulearam diminutos feixes da luz matinal que despontava algures a este, empoleirando-se nos topos dos eucaliptos e dos pinheiros. O céu clareou gradualmente, à medida que a luminosidade lhe estendia os seus mornos braços de fim de Verão. A norte, o baldio ainda estava imerso na treva que se ia dissipando com a chegada da manhã. Do solo seco, emergiam pequenas ervas escuras e ralas, a girar em acanhados vórtices na brisa rasa que acariciava o chão. Esta transportava a fragrância fresca das agulhas dos pinheiros, ainda molhadas do orvalho, a pingar. Ao longe, ouvi o som de cascos de cavalos e o roçar das rodas das carruagens na terra batida. Formavam-se, sobre o tímido brilho da madrugada, nuvens pálidas a desmaiar no horizonte. A estrada já era visível, a entrar pelo matagal que formava um túnel de arvoredo à sua volta, num acolhedor leito de verdes folhas e ramos maleáveis de tão jovens. Longe, onde já se perdia a visão em toda a frondosa verdura, a torre da Igreja erguia-se da clareira. Esbranquiçada, quase trémula sob a luz que a envolvia cegamente, parecia um vestido de baptizado a brilhar com a alegria de um recém-nascido corado.

            O relógio vertical de pinho bateu pesadamente as sete horas, a um compasso metálico que me revibrava no tímpano desconfortavelmente. Finalmente, a orla do sol resplandeceu através dos pinheiros e dos eucaliptos, envolta numa névoa rósea e amarela. Hesitante, bamboleou-se no cume da floresta até assomar imperialmente e cobrir tudo à sua passagem por uma camada de dourada tranquilidade. Já me chegava o cheiro da terra, da flora, o som dos pássaros a agitarem as penas nos ninhos como se as estivessem a vestir. Aproximavam-se as carruagens, ouvi o estalar de um chicote no dorso de um cavalo que corria elegantemente ao longo da aba da floresta. Soube que estava na hora de recolher. Fechei a janela, uma claridade baça revestiu o compartimento de pedra. Deixei a paisagem absorver totalmente o esplendor do alvorecer.

 

 

 

(Texto feito por mim - não pertencente à série - para a Fábrica de Histórias.)

 

publicado por Katerina K. às 20:42

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