Eu estava em casa da Gabrielle.
É um sítio diferente. A casa é estreita e muito alta, pintada de branco, com os caixilhos das janelas verdes. Costumava ser um sítio cheio de figuras de santos e coisas religiosas, mas desde que a avó dela morreu que a mãe dela se livrou de tudo, mesmo mobílias velhas, e deu uma redecoração moderna no sítio.
Eu encontrava-me na cozinha, a bater com a ponta do chinelo amarelo no linóleo aos quadrados pretos e brancos, enchendo um jarro com sumo de laranja fresco. Os gatos da Gabi roçavam-se nas minhas pernas cobertas por uns jeans finos e claros.
- Janinha, vais demorar?
A voz dela vinha do quintal, onde havíamos improvisado um acampamento «de mulheres» como ela lhe chama. Já não é a primeira vez que o fazemos. Montamos uma tenda no meio do quintal, enchemos aquilo de revistas, sumo, bolachas...e ficamos lá dentro a passar um bom bocado. Desta vez decidimos ficar cá por fora. Estendemos umas toalhas no terraço, decidimos fazer o Verão na Primavera.
- Já vou, já vou!
Enxotei o Panda ao de leve com o pé, mas este seguiu-me, miando e fazendo-me olhinhos. Desci as escadinhas de pedra e pousei o jarro no cimento, mesmo junto à toalha da Gabrielle.
Deitei-me junto ela, suspirando fundo. A Gabi, de olhos fechados, perguntou:
- Já viste as nuvens?
- Não.
- Vê...observa...
À primeira vista, só vi borrões de vapor de água. Mas depois aqueles entes brancos e disformes começaram a fazer algum sentido. Dei uma risada leve.
- Ah, - murmurou ela - reparaste...
- Em quê?
- No homem.
Sim, realmente ela tinha razão. Havia um homem de nuvem no céu. Ele andava, saltitava... Era engraçado ver aquilo, uma pessoa de nuvem numa dimensão de nuvem, onde tudo é feito de nuvem. De repente, o homem começava a tomar feições familiares...
Abanei a cabeça...
Foi aí que a Gabrielle perguntou:
- Acreditas em bruxaria?
Ri alegremente, enquanto o Panda me subia para o peito e se enroscava, tentando dormir um pouco e eu o acariciava atrás das orelhas.
Até a um próximo post,
Joana F.